sexta-feira, 28 de março de 2008

O povo é ignorante e o governo é uma piada.

Não sei como é em outros países, mas, no Brasil, os pais normalmente não incutem nos filhos o gosto pela (boa) literatura porque também foram educados mal na escola. Convenhamos, escola é um negócio chato pracaralho, em todas as matérias; tudo é ensinado nas coxas, de forma antiquada, por professores mal preparados e engessados por grades curriculares as quais os velhotes do MEC estão pouco ligando se ainda funcionam ou não.

Tive sorte de aprender a ler (sozinho) com três anos e a escrever com quatro porque, a despeito de ter pais que não foram educados com livros, souberam me ensinar; por isso sempre convivi com boas leituras, desde sempre. Porém, se fosse depender da escola, estava fudido.

Especificamente no caso da literatura, as coisas até começam bem no ginásio: eu estudei sempre em escola pública (estadual) e tive boas leituras das inefáveis séries Vaga-Lume e Para Gostar De Ler. É promissor, vejam só, mesmo para crianças que não lêem em casa, terem o primeiro contato literário com Lúcia Machado de Almeida, Drummond, LFV, Lourenço Diaféria, Ignácio de Loyola, etc. Ainda há o problema da obrigatoriedade, de aquilo ser "para nota", "para prova", mas não vou entrar nessa questão agora.

Só que, quando chega no colegial, qualquer semente literária plantada no Ensino Fundamental é impiedosamente pisoteada pela grade curricular: até hoje ninguém me convenceu do porquê de se ensinar Literatura Brasileira em ordem cronológica, visto que as correntes literárias, longe de se complementarem seqüencialmente, geralmente negam o imediatamente anterior. Assim o pobre moleque chega no Ensino Médio e lá vem as chatíssimas novelas de cavalaria, Os Lusíadas, Gil Vicente... quem vai tomar gosto pela leitura com "as armas e os barões assinalados", me diz?

Custava fazer ao contrário, por exemplo? Começar pelos escritores contemporâneos, pra molecada pegar o gosto, ver que ler não é necessariamente um troço chato e pedante, para que ele vá evoluindo “na contramão”? Começa-se fisgando o aluno com LFV, Mário Prata, Rubem Braga; e vai-se voltando, com Drummond, Graciliano, Ignácio; até que, no final do curso (terceiro ano), quando o aluno tiver que encarar literatura colonial, barroca, classicista e medieval, terá uma visão contemporizadora daquilo, sem anacronismos.

Ele poderá até continuar achando Senhora um livro chato pra caralho, mas vai entender melhor o contexto de tudo aquilo, e respeitá-lo-á por já ter uma bagagem montadinha estofada pelos clássicos modernos e contemporâneos.

Ah, também não sei como é mundo afora, mas acho um absurdo não haver nada de literatura mundial em favorecimento da literatura colonial lusófona.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Faça uma lista dos piores filmes.

[Meu critério para piores filmes envolve sempre grandes produções; dinheiro que podia ter sido usado para uma coisa decente e foi gasto em porcaria – por isso você não vai encontrar filmes trash e/ou coisas do Chuck Norris. A essência do filme revoltantemente ruim é a empáfia: o sujeito realmente acha que está fazendo uma grande obra.]

Armagedom
Qualquer coisa que tenha o Aerosmith (eca!) no meio já é a pior coisa do mundo automaticamente; mas esse filme passa dos limites: produção de Jerry Bruckheimer e direção de Michael Bay, sinônimos de muitos defeitos especiais e nenhuma história que preste – no caso um amontoado de clichês, aviltamento de princípios básicos da ciência, do bom-senso e da verossimilhança, além de resoluções pra lá de capengas – e um dos piores elencos de todos os tempos, com os inomináveis Bruce Willys (e sua eterna cara de “fodão entediado”, cujo maior recurso dramático é franzir a teste e fazer biquinho), Ben Affleck (preciso comentar?) e Liv Tyler, que só está lá porque o papai estava na trilha sonora e porque alguém precisava dar para algum dos mocinhos na história (se é que pode se chamar aqui de história). O pior foi que saiu na mesma época do imensamente superior Impacto Profundo – com tema bem semelhante –, o qual, por não ter muitos atores famosos, nem lobby, tampouco dramalhão ou pirotecnia, e sim foco nas questões humanas da eventual situação, foi meio que ignorado nas bilheterias. Asteróide do tamanho do Texas descoberto em 18 dias? E daria para algo ser feito além de rezar? Ah, e a melhor solução seria enviar perfuradores de petróleo para salvar o mundo? O asteróide, na superfície, era mais cheio de pontas que a Fortaleza da Solidão do Super-Homem? Morri.

O Quinto Elemento
Outra combinação bombástica (no mau sentido): Luc Besson, Bruce Willys (sempre ele), Mila Jojovich, com direito a uma ponta medonha de Chris Rock, num arremedo de Blade Runner com, sei lá, Capitão Planeta – a diferença é que o quinto elemento, em vez do “coração”, é “mulher gostosinha”. Tão ruim que dá até preguiça, e, aliás, foi o que fiz: dormi deliberadamente no cinema.

Qualquer filme que tenha o Nicholas Cage, o Tom Cruise ou o Keanu Reeves
Preciso explicar?

O Grito
Japonês não sabe fazer filme de terror, não adianta. Aliás, ainda estou esperando um japonês que saiba fazer filme desde o Kurosawa. Enfim... o fato é que, se O Chamado ficou ótimo refilmado por Gore Verbinski e estrelado pela ótima Naomi Watts (o original é tosquíssimo), este aqui é ruim tanto no original quanto na franquia (idem para Água Negra). História frouxa, cheia de buracos, aliás, crateras, sustos meia-boca – nada além do sombra-passando-no-fundo + corte-rápido + violinos-estridentes. E tem o Bill Pullmann, o que já deixa a nota do filme imediatamente negativa.

Olga
Pobre Olga Benário: sua história de coragem e luta resumida a um dramalhão de novela das oito global, com direito a atuações canastronas e política jogada para escanteio (Intentona Comunista, por exemplo, resumida a... duas cenas!) em detrimento de um romance que, no livro, durava um parágrafo (no filme levou quase uma hora). Foi a única vez, acho, em que eu realmente achei que ia me levantar e abandonar a projeção, tamanha a revolta.

A Paixão De Cristo
OK, abandonar uma confortável carreira de ator para dirigir filmes extremamente autorais é louvável – Coração Valente é um dos meus filmes preferidos e, a partir dele, todas as cenas medievais de batalha tiveram que ser realistas e sangrentas – mas, aqui, ele errou feio: além da terrível escolha do canastrão Jim Caviezel como protagonista (se o cara não consegue se destacar fazendo o personagem mais emblemático da história da humanidade, vai interpretar direito quem?), do excesso de câmera-lenta e da violência exagerada, que acaba ficando cansativa e anestesiando o espectador, Mel Gibson erra feio ao não conseguir conciliar sua inserção de simbologias, perversões sangrentas e anti-semitismos num filme que era para ser “realista”: se o flagelamento fosse daquela forma, Jesus não teria saído vivo nem dali; ninguém carregava a cruz inteira, pois pesaria mais de 50 quilos – os condenados levavam só a parte horizontal – e por aí vai.

O Terminal
Se eu fosse o cara retratado no filme, tinha processado todos os envolvidos no filme; um estrangeiro, só por não saber falar inglês, foi transformado num completo palerma, patético, em situações pífias. O superestimado Tom Hanks no papel de bobo – e é praticamente só o que ele sabe fazer –, uma gostosa no papel de gostosa, umas situações ridículas e um final piegas – defeito inevitável de tudo que o genial Spielberg faz. Eu não via era a hora “terminal” do filme para ir embora do cinema.

Efeito-Borboleta
Pegue um atorzinho de comédia romântica, uma tentativa mal-sucedida de fazer um Donnie Darko, use um roteiro cheio de absurdos, buracos (abismos!) e o-que-eles-acham-que-é-teoria-do-caos e voilá, uma tranqueira cinematográfica que alguns patetas ainda acham genial.

Chamas Da Vingança
Se é dirigido pelo Tony Scott, irmão sem talento do Ridley, já é caso de ficar com o pé atrás; Denzel Washington e Dakota Fanning no auge da fase “quero faturar, o que me chamarem pra fazer eu aceito” e lá vem esse lixo extremamente manipulador e preconceituoso, no qual os mexicanos são criaturas pouco confiáveis e que não merecem proteção da lei, sejam culpados ou inocentes.

Tempo De Matar
Outro que entra na lista mais pela questão moral do que pela cinematográfica (na qual ele também não é lá essas coisas); afinal, se estupram sua filha, você tem, digamos, o “direito” (vocês me entendem) de querer se vingar. O problema é que o pai que se vinga, matando os estupradores no filme, é inocentado pelo tribunal e ainda sai como herói! Mas que cazzo é isso? Ele fez o que muita gente faria? Sim. Seu crime teria atenuantes? Claro. Mas justice com as próprias mãos ser saudada pela Lei? Socorro.

Menções horrorosas: Rei Arthur, qualquer coisa do Kevin Costner, quase tudo do Joel Schumacher, todos os Batman pré-Christopher Nolan, Pecados Íntimos, O Homem Sem Sombra, Homem-Aranha III, A Reconquista, Hulk, todos os Star Wars recentes, Cazuza (aliás 99% dos filmes nacionais, visto que temos o pior cinema do mundo), Jornada Nas Estrelas V, Highlander II, O Chamado II, O Último Matador, Corpo Em Evidência, Os Esquecidos, Cadillac Cor-De-Rosa, Todo-Poderoso, Olhos Famintos, Xeque-Mate, Duna, Predador II, Alien IV, A Era Do Gelo, O Nono Portal, Era Uma Vez No México, O Sombra, O Fantasma...

terça-feira, 18 de março de 2008

Quem lê tanta notícia.

“Nós desfilamos, não caminhamos. Somos a elite intelectual do país.” (Arthur Virgílio, na Rolling Stone desde mês – nº18, irmãos Cavalera na capa)

Nos Editoriais, o Estadão deste domingo deu uma disfarçada, falando sobre generalidades como a crise Colômbia-Venezuela-Equador, a alta do petróleo e os tribunais superiores (sei lá o que é isso, nem li).

Porém na sessão de cartas, a qual nem leio pra não passar raiva com as cartas-marcadas (com e sem trocadilho), ao lado do nosso já conhecido e amigo íntimo Gaudêncio, trouxeram, para alternar com FHC e Pedro Malan, o insuspeitíssimo Celso Lafer, que foi ministro de adivinha quem?

Enquanto o primeiro vem com o papo passadista de sempre, o segundo insiste que o Brasil precisa necessariamente tomar alguma posição nesse imbróglio (essas palavra é feia, mas sempre quis usá-la) entre os três países-patetas. Ah se o Brasil resolvesse tomar conta dessas baderna, já até imagino a capa da Veja comparando Lula ao “ditador” Chávez e conclamando o Bush à retaliação pelo bem da liberdade da home dos free e das land dos brave.

No Folhão o Clóvis Rossi reclama, pra variar (pelo menos reclama do trânsito em São Paulo), a Catanhêde faz redação ginasiana e o Cony num fala coisa com coisa (além das cartas-marcadas também). Já o Antônio Ermírio de Morais disse algo sensato, mas sem querer, e vou usar isso em outro assunto. Já no resto da “parte nobre” houve praticamente um surto comunista: o Editorial fala mal do governo estadual e deram colunas pro Mercadante e pro Niemeyer. Deve ter sido algum hacker do paste-up.

Na mídia em geral o trânsito caótico ao nível do impraticável – do qual venho falando bem antes, verdade seja dita – é a tônica das críticas ao Kassab e ao Serra, ainda que dificilmente eles sejam citados nominalmente, salvo nos blogs de jornalistas. E o Vampirão faz que não é com ele, como mostram diversas matérias do sempre certeiro PHA. Engraçado ele dizer que não ele com ele, sendo que esse fenômeno da "invasão dos carros" não é nacional, mas concentrada especialmente em São Paulo, como mostra uma matéria do Estadão.

São Paulo acabou.

Se eu fosse um cara diferente, sabe lá como eu seria.

Estranho como sentimo-nos, às vezes, extremamente atraídos, próximos e íntimos de pessoas que não vimos e das quais sabemos tão pouco delas. E nem me refiro a personalidades de vultos, pois assim até é compreensível e fácil, tendo em vista o material histórico, as obras, as fotos, os filmes, os estudos. Refiro-me a completos anônimos, cidadãos comuns como esses que se vê pela rua. Como o simples fato de eles haverem caminhado sobre este mesmo orbe infame pode definir de forma tão profunda o que somos e podemos ser.

Talvez seja a real expressão de deixar a vida (de uns) para entrar para a história (de outros). Alguém que deve ter sido essencial e especial para tantas pessoas, depois de tanto tempo morto consegue influenciar da forma mais improvável a formação de alguém que surgiu tão depois e que, de incerta forma, tanto se identifica.

No ar, num ato qualquer, certo temor. Passou-se um segundo – talvez o amor – e sua vida foi levada como um beijo, como um vento, como um bater de asas, como um recuar de ondas, como o cair da noite.

E, a despeito de memórias inocentas da primeira vida, em necrópoles distantes e mal-cuidadas, sob sol e sobre poeira, em tumulares silêncios e veladas paredes enegrecidas cheias de gavetas de pessoas semi-esquecidas, está tudo lá, ainda.

Um assunto-tabu revelado entre lágrimas contidas, após tantos anos de estilhaços e migalhas, de traumas e incertezas; um segredo, uma tentativa abstrata, um sucesso concreto, num hospital, numa dança, numa praia, num bálsamo, num disparo. E tudo retornou à praia sulfurosa de mim como as ondas que um dia recuaram além de onde quebraram, porém nunca as mesmas águas.

Porém para mim bastava: finalmente o círculo se fechava como rodam os discos cheios de aforismos colados enigmaticamente, hipnoticamente reproduzindo com o chiado das canções o espírito que ao mesmo tempo me pesa e me engrandece. Seria eu totalmente diferente sem essa herança bela e maldita, bem que vem do mal, sul do paraíso, eternidade no estilo do desejo.

segunda-feira, 10 de março de 2008

As pessoas que "se enrolam" nos jornais não são mais notícia.

O Estado de FHC, quero dizer de São Paulo, pra disfarçar um pouco, trouxe, em vez do Farol de Alexandria, o Pedro Malan – pluralismo é isso aí – ao lado do já conhecido e nefasto Gaudêncio Torquato. Mas desconfio que haja uma escola para tucanos escreverem mal, ou que sejam todos bogus do FHC mesmo. Além do conteúdo previsível (o primeiro fala que bom-mesmo-era-no-tempo-deles, o segundo gasta a coluna inteira para falar... do PSDB em-si). Efeagá precisa disfarçar melhor que é tudo escrito por ele. Mas seu estilo é inconfundível: a abundância de clichês, lugares-comuns, reducionismos e vícios de linguagem é assustadora.

Pedro Malan compara o discurso governista, nesta ordem, aos estratagemas de Schopenhauer em Como Vencer Um Debate Sem Ter Razão, à propaganda política de Goebbels e ainda faz a famosa citação de quem não leu Sartre não sabe o contexto da frase (“O Inferno são os outros”). Deprimente.

Gaudêncio começa praticamente um imortal da ABL (do naipe de Paulo Coelho, Arnaldo Niskier, Ivo Pitanguy, Roberto Campos (Rest In Hell) e José Sarney: "Que há alguma coisa no ar do País fora os aviões da Força Aérea e os tucanos [epa] da Força Aérea, há muito já sabemos". Depois ele me sai comparando o Programa Territórios da Cidadania assim: “após fechar a porteira, o estilo providencial do mandatário cuida de ajustar o apito dos condutores de rebanho”. Fabuloso, hein? Só faltou usar o incrível termo mainardiano “bovino”.

Não satisfeito, ele encerra “com chave-de-ouro” (ah ah ah), justificando o título supercriativo de sua coluna, dizendo que Lula “prepara o cardápio presidencial dos anos que virão” justamente “enchendo o meio do prato e comendo pelas bordas.”

É ou não é de fazer sangrar o nariz?

Já na Folha de José Serra, digo de São Pulo, Clóvis Rossi, como sempre, reclama de tudo que possa se relacionar à esquerda, com ou sem razão. Élio Gaspari é uma grata surpresa, sempre, criticando ou elogiando as coisas e pessoas de forma relativamente independente. Embora Alckmin seja invariavelmente escrachado por lá (por ser “inimigo” do Presidente Eleito), e de às vezes nunca um petista escrever um artigo genérico sem muita relação com o próprio governo (vai entender), lá também os tucanos recalcado insistem em deixar a História para tentar entrar na vida. Walter Feldman (porra, mais um tucano!) segue a cartilha de FHC e seus bogus, dizendo que “o PSDB é uma instituição consolidada, enraizada nos municípios brasileiros como paradigma de bom governo. Na conjuntura nacional, vivenciamos nos últimos anos a experiência do papel de oposição a um governo que se apropriou de soluções que havíamos criado na economia e na área social. O que está dando certo no Brasil é legado nosso, embora o governo não o reconheça”. Então ta, né.

E a Eliane Catanhêde (sim, ela mesma), coitada, com seu texto de pré-vestibulando, sem nenhum brilho, nenhum estilo, nenhum atrativo, nada que pudesse, por mérito, alçá-la de repórter comum a colunista de área nobre do jornal, é café-com-leite.

domingo, 9 de março de 2008

Faça uma lista de grandes músicas sobre suicídio.

01. A Moment Of Clarity (Satyricon)
02. Beyond The Realms Of Death (Judas Priest)
03. Exit (U2)
04. Fade To Black (Metallica)
05. Gestern Starb Ich Schon Heute (Bethlehem)
06. Help Me Disappear (Katatonia)
07. Suicide Is Painless (M.A.S.H. Theme)
08. Suicide Note Pt. I (Pantera)
09. Suicide Note Pt. II (Pantera)
10. Viernes 3 A.M. (Os Paralamas Do Sucesso)

sábado, 8 de março de 2008

Faça uma lista de grandes solos de guitarra.

Alívio Imediato (Engenheiros Do Hawaii)
Solo de Augusto Licks

Another Day (Dream Theater)
Solo de John Petrucci

Change Of Heart (Bruce Dickinson)
Solo de Roy Z

Feira Moderna (Beto Guedes)
Solo de Beto Guedes

Fullmoon Madness (Moonspell)
Solo de Pedro Paixão (não tenho certeza)

Keeper Of The Seven Keys (Helloween)
Solo dobrado de Kai Hansen & Michael Weikath

Mistério Do Planeta (Novos Baianos)
Solo de Pepeu Gomes

Natural (14 Bis)
Solo de Cláudio Venturini

Romance Ideal (Os Paralamas Do Sucesso)
Solo de Herbert Vianna

Something (The Beatles)
Solo de George Harrison

Timidez (Biquíni Cavadão)
Solo de Carlos Coelho

sexta-feira, 7 de março de 2008

Cor contritum quasi cinis.

"O Tito está morrendo na caixa lá fora. Coloquei jornal porque tem mosca azul tentando chegar nele. Toma conta dele até eu chegar – espero que ele me aguarde... ou não. Mother."

Esse bilhete, na mesa da cozinha, foi o terceiro contato sensorial com este mundo-sexta-feira, logo após o abrir de olhos e o movimento de tirar os pés da cama e colocá-los no chão.

Era o início do último dia de Tito (nome dado por minha mãe – gato pra mim ou é só Gato ou tem nomes criativos como Branco e Amarelo), gato meio-siamês velho-de-guerra daqui de casa. Várias coisas a serem resolvidas comigo e com os outros, e o gato lá, insistindo em se levantar mesmo sem força alguma, só para cambalear, ofegante, espalhando o sangue escuro pela boca e tombar o corpo esquelético no chão duro.

Durante toda a manhã, troquei seus panos de deitar, levei-o de volta à caixa-cama, limpei o que dava para limpar da sua boca pútrida, afastei as moscas, atraídas pelo calor e por seu estado agonizante. Dei-lhe água em gotas que eu apanhava com a mão e deixava correr pelos dedos até os respingos lhe atingirem a língua empapada de sangue e pus.

Conforme a metade do dia se aproximava, seu desespero era evidente... os olhos vidrados, a respiração por um fio, o sangue pingando, excrementos já saindo sem esforço, mas uma insistência em sair de cama e ir ao chão, talvez pelo frescor.

Resolvi atender seu pedido e sentei ao lado dele, não só por causa das moscas-bicheiras, mas para lhe fazer companhia. Fiz nele seus carinhos preferidos naquele pelo ralo, naquela pele como um trapo estirado numa cruz feita de ossos, estandarte da impiedosa e impermamente natureza: cocei levemente a tampa de sua cabeça, as costas – cuja coluna proeminente quase sem carne por cima me dava a sensação de tamborilar uma engrenagem – e o que ele mais gostava, no pescoço, mesmo com toda aquela sujeira (claro que fui cuidadoso para não machucá-lo).

Duas horas de avanço na tarde, Sol rumo ao oeste, ele parou de se mexer “normalmente”, para iniciar os últimos espasmos, enquanto o sangue e os excrementos saíam em jorros, a boca, num abrir inexorável, incoercível, de dor suprema, indizível, se abria além do possível num desprendimento das peles internas, emitindo um ganido fantasmagórico. Ao seu lado, impassível, eu apenas continuava a lhe fazer carinho e lhe acalmava os membros em convulsão. Como eu torcia pr'aquele sangue parar de espirrar, pr'aquele corpo magérrimo parar de tremer logo!...

Expirou às 14h18min.

Enquanto seu corpo ainda emitia sons guturais do ar que ainda lhe havia nos pulmões e seu corpo ressequido se agitava em rigor-mortis, fiz algo não só por ele, mas por minha mãe, que havia pedido para eu cuidar dele.

Sei o quão difícil vai ser quando ela chegar do trabalho, daqui a menos de uma hora. Só os deuses que não existem sabem o quanto ela fez pr'esse gato viver, desde que chegou aqui, há uns cinco anos, já velho e caindo aos pedaços (literalmente). Deu comida, tratou, deu banhos semanais, remédio e comida na boca, gastou fortunas no veterinário, perdeu tantas horas lhe fazendo companhia.

Ah, e como ele retribuía honestamente! Esperava-a chegar do trabalho, indo da impaciência no quintal desde o meio da tarde até esperá-la lá embaixo, no portão, só para subir junto com minha mãe. Ficava do lado dela esperando não só para beber leite após o jantar, mas para ir com ela à sala “ver o Jornal Nacional”. Minha mãe ficava com pena de colocá-lo para fora em noites de frio a ponto de passar a ferro a almofada da pequena cama dele – ele só não dormia dentro por falta de modos fisiológicos, digamos – e, até o último dia, gosto de crer que ele cambaleava esperando minha mãe chegar. Ela não lerá isto aqui, mas gostaria que ela soubesse que ela fez o possível para esperá-la uma vez mais.

Agora está devidamente limpo, coberto por minhas flores preferidas (que trabalho pra depenar o quintal até juntar o tanto de florais para cobri-lo) e com a caixa protegida e desinfetada (contra moscas e afins) à espera da “mãe” dele.

Seu cadáver sépia coberto de flores amarelas; nos olhos vazios e já opacos, delicadas florezinhas azuladas. E, em sua boca adoecida, já em descanso nos coágulos enegrecendo, duas azáleas, minhas flores prediletas, as últimas do jardim.

[Isso que fiz hoje não foi nada comparado a todo esforço dela. Foi só um mísero carinho da minha parte, em respeito a tudo que ela fez, ao seu caráter e à sua bondade.]

Os instantes vão caindo, pancada a pancada, sucessivamente. Hoje eu que a espero, apreensivo, temendo e sofrendo antecipadamente pelo que ela irá sentir. E só eu, só eu que estava lá, sei como foi.

Mas possa minha mãe saber que, em nossa memória, ele estará sempre colorido e perfumado à espera dela, nos dias que serão para sempre.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Faça uma lista de grandes canções [de artistas dos quais tanto(s)] falam mal.

Belchior

01. Comentário A Respeito De John
02. Como Nossos Pais
03. Conheço Meu Lugar
04. Coração Selvagem
05. Fotografia 3 X 4
06. Não Leve Flores
07. Paralelas
08. Pequeno Perfil De Cidadão Comum
09. Recitanda
10. Tudo Outra Vez

***

Biquíni Cavadão

01. Bem-Vindo Ao Mundo Adulto
02. Duas
03. Em Algum Lugar Do Tempo
04. Hotel
05. Impossível
06. Inocências
07. Meu Reino
08. Quanto Tempo Demora um Mês
09. Tormenta!
10. Vou Te Levar Comigo

***

Engenheiros Do Hawaii

01. A Violência Travestida Faz Seu Trottoir
02. Alívio Imediato
03. Concreto E Asfalto
04. Eu Que Não Amo Você
05. Lance De Dados
06. Nuvens
07. Outono Em Porto Alegre
08. Pampa No Walkman
09. Quartos De Hotel
10. Vozes

***

Lulu Santos

01. Auto-Estima
02. Esta Canção + Tempo/ Espaço
03. Fevereiro
04. Papo-Cabeça
05. Ro-Que-Se-Da-Ne (junte as sílabas e forme novas palavrinhas)
06. Seu Mal + Metal Leve
07. Tudo Bem
08. Twist
09. Um Vício
10. Vale De Lágrimas

***

RPM

01. A Cruz E A Espada
02. Estratégia Do Caos
03. Gênese
04. Juvenília
05. Liberdade/ Guerra Fria
06. Pr’esse Vício
07. Sete Mares
08. Sob A Luz Do Sol
09. Teu Futuro Espelha Essa Grandeza
10. Vem Pra Mim

terça-feira, 4 de março de 2008

Eternidades da semana

Só eu não estou nem aí pra sucessão de Fidel (não vai acontecer nada), nem pras bravatas do Chávez (não vai fazer nada), nem pras prévias eleitorais americanas (não vai mudar nada)? Acho que é um novo tipo de patrulha ideológica: antigamente, você sabia ou não sabia das coisas; como hoje, pelo menos pra classe média, o acesso à informação é fácil, todo mundo quer palpitar, tomar partido, e pior, querer que todos também o façam.

***

Só eu acho revoltante que imigrantes que vieram fugidos pra cá há mais de cinqüenta anos não falem português e ajam como se estivesse na amada pátria que eles renegaram e que os renegou?

***

“Na cultura, chegamos à ditadura do proletariado que Marx queria ver na economia e felizmente não aconteceu. As vozes mais irresponsáveis, mais barulhentas e agressivas estão erodindo a autoridade do jornalismo tradicional. Quando todos têm o mesmo direito de falar, acaba a discordância. É o igualitarismo antidemocrático. Vivemos um clima de hostilidade ao mérito e ao talento que destaca certas pessoas. Acesso não tem nada a ver com democracia, é um grito de guerra do consumidor. Mas quem fala sobre isto é acusado de elitista.”

É, elitista eu não sei, mas de idiota eu acuso o crítico cultural Lee Siegel sem medo de errar. Claro que há a opção de um monte de palermas que nem ele, só que anônimos, divulgarem suas bobagens cheias de achismos; por outro lado é a primeira vez na História em que não somos mais reféns da grande mídia. PHA, Azenha e Nassif não me deixam mentir. Pensou ficar dependendo dos bogus do FHC para se informar?

Ficaríamos com a voz oficial do tucanismo, que diz que o PCC (que, coincidentemente, nasceu, cresceu, engordou e dominou a casa nos 12 anos de PSDB no Governo do Estado) está dominado, que não tem mais problema.

Pra encerrar, as palavras do padre José Benedito Simão, da Brasilândia (Zona Norte) ameaçado de morte (assim como o subprefeito da região).

“Onde o Estado não marca presença, as pessoas buscam outros tipos de organização. Antes da presença deles (PCC) nos presídios, a vida dos presos era muito difícil. Eles se organizaram e conseguiram colocar um pouco de ordem nos presídios. Dói no coração depender de um regime violento para ter ordem. É o que acontece também nas nossas favelas. A assistência que o crime dá, do leite à criança ao gás para a mulher, conquista o respaldo da população, infelizmente. Uma mulher cuja filha está sendo ameaçada, a polícia não toma atitude, o chefão traficante acaba resolvendo o problema dela.”

segunda-feira, 3 de março de 2008

Muda o nome e terão todos forma única.

"And that goes for all you punks in the press that want to start shit by printin' lies instead of the things we said. What you pissed off? Cuz' your dad gets more pussy than you? Fuck you! Suck my fuckin' dick!"

Os limites do Jornalismo no Brasil já foram ultrapassados há muito tempo, isso já não é mais segredo. Mas tem horas em que a estupidez é tão colossal que a reação é até física. Madrugada adentro, Cantando Na Chuva no DVD e cerveja na caneca, eu lia os jornais do dia sentado no tapete, até me deparar com a segunda página do Estadão, com o protolocar artigo semanal do FHC, mentiroso, demagogo, passadista e rancoroso como sempre. Uma porcaria mal feita (como escreve mal, é tudo tão raso e prolixo!), mas já esperada. E, ao lado, o outro palerma, o sidekick, o escada, o que levanta-pr’outro-chutar, Gaudêncio Torquato.

[É como se o FHC tivesse duas páginas inteiras só pra ele no jornal (deviam dá-lo isso logo), visto que, além de seu quarto de página, os dois editoriais, as outras colunas e até a sessão de cartas é milimetricamente alinhada ao que nosso Grande Guia Genial Para Os Povos diz. Mas o Gaudêncio Torquato, a não ser que alguém me diga que o conhece, me cheira a bogus do próprio Éfeagá, pois ele exagera. E nesse domingo ele deu muita bandeira, logo vão descobrir que o FHC escreve o jornal inteiro.]

Depois das puxadas-de-saco costumeiras, como “a chegada, quase sem fôlego, ao Plano Real de Itamar e FHC, quando os trens foram atrelados à locomotiva”, ele me sai como a pérola jornalística da década (ta bom, vai, empata com os dólares na caixa de uísque da Veja): "...o primeiro índio a receber espelhos de Pedro Álvares Cabral, em 1500, na Bahia, emprestou o DNA às tribos políticas festejadas com agrados no Palácio do Planalto. Quem duvida que os presentinhos do início da colonização foram o berço dos cartões corporativos de hoje?”

Juro que meu nariz até sangrou, deve ter sido uma reação literalmente sangüínea da minha personalidade... imediatamente após ler isso, vi pingarem gotas rubras no papel, manchando aquele texto espúrio, mequetrefe e falacioso.

Outros assuntos ficam para amanhã, isso foi demais para um final-de-semana só.

"Printin' lies, startin' controversy... you wanta antagonize me? Antagonize me motherfucker! Get in the ring motherfucker! And I'll kick your bitchy little ass! Punk!"

domingo, 2 de março de 2008

If you could see what I saw with your eyes!...

Vi Patton – Rebelde Ou Herói (1970) ontem à noite, de madrugada. Grande filme. Não gosto de guerra (sim, tem que goste), nem de militarismos em geral, mas costumo gostar de filmes do gênero: normalmente rendem bons programas, assim como acho boxe uma porcaria (para mim nem esporte é), mas filmes sobre isso são geralmente bons. Se bem que filme bom é filme bom, não importa o tema, e, talvez, guerra (e boxe) seja um tema propício a mostrar a fragilidade da condição humana, o quanto a tal “civilidade” é somente um fino verniz sobre nossa selvageria inviável e inevitável.

Meu pai é fã do Patton, desde sempre, por isso dei-lhe esse DVD de presente não lembro quando nem por qual data (enfim...). Patton acreditava em reencarnação, que tinha lutado em grandes batalhas entre cartagineses e romanos. Meu pai acredita em algum deus (não sei qual). Mas já me contou sonhar que esteve com o general em campos imemoriais de guerra.

Não gosto de guerra, como já disse, e discordo de quase tudo que meu pai fala, exceto no quesito futebol. Mas gosto dele e de ele falando sobre estratégias militares e seus tempos de caserna. É um verniz que, não separando, nos une mais.