segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

'Till Ten Years

Imagine um disco que tome todas as influências essenciais do black metal norueguês – a última coisa realmente nova que apareceu no metal, e faça um disco único, maravilhoso, transcendental, antes de embarcar numa viagem, altamente válida e recomendável, aliás, de sujeira das ruas. Um Travis Bickle de corpse-paint, por aí. Voltando ao disco, é uma mistura de Dark medieval Times, Vikingr Veldi, In The Nightside Eclipse e De Mysteriis Dom Sathanas. Resumindo, só coisa foda. Imagine. Sentimento nórdico, frio, gélido, com influências folk, teclados, linhas criativas de guitarra, produção OK. Pra quem gosta de boa música. http://www.myspace.com/decemberwolves

Meus is não têm ponto, eu não peço desculpa, escrevo deus com letra minúscula.

Não invento palavras. Não escrevo palavrão. Quase. Não sai senão de Deus o ovo de Satã. Não pretendo chocar gratuitamente, preciso ser pago. Trago o horror com um punhado de palavras comuns. Amor e morte, mil vezes. Azar e sorte. Sem invencionices, nem modismos. Além das críticas recalcadas e das incompreensões. A escrita é tensão, é tesão. Espírito feito arco retesado, quase a arrebentar. Pois sem mim o existir não há.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Vastas emoções e pensamentos imperfeitos

[14h34min] Os ursos estão cada vez mais canibais. O céu desaba como temia Abracurcix. Automóveis se amontoam, subindo até nas paredes, feito baratas saindo do esgoto e invadindo o ralo de casa. Ai, odeio baratas. E automóveis. Nessa ordem, eu acho. Vias nasais e marginais congestionadas. As mentiras transbordam feito a lama do Tietê, trazendo expelindo a miséria que a classe média finge não ver quando confirma o voto na urna eletrônica, coisa de Primeiro Mundo, aliás, até melhor. Que bom se pudéssemos ensiná-los a votar também. Mas estamos no mesmo barco poluído de idéias ruins e pensamentos imperfeitos. Canibais católicos pedem desculpas por terem comido o missionário. O temporal desaba ácido enquanto ecoam os gritos do Datena na televisão. Ele vibra, indignado, contra tudo e todos. A justiça que ninguém quer, mas todos aplaudem. E a chuva, ah, a chuva traz mais baratas. E ratos. Pensamentos também se amontoam e desabam feito barranco sobre os barracos e sonhos. O voto é nulo feito o meu existir. Desistir. Resistir. Preciso beber alguma coisa rapidamente. Na versão do Fagner, por favor. [14h38min]

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O futebol é uma Configuração-Dos-Lamentos de surpresas

Final atípica de campeonato. Quatro finais ao mesmo tempo, luta pela Libertadores, luta pra fugir do rebaixamento, resultados que iam mudando durante as partidas e fazendo com que os times se alternassem nas primeiras e últimas posições. Estádios lotados (exceto Engenhão e Morumbi, mas aí é normal, né), porrada no campo, porrada fora dele. Inter campeão, Flamengo campeão, Inter campeão, Flamengo campeão. Palmeiras fora-dentro-dentro-fora. Fora mesmo, até da Libertadores. São Paulo e Inter chorando, pra variar. E nós, corinthianos, só tirando sarro. Atlético Mineiro amargando uma posição medíocre, Cruzeiro chegando no final. Times cariocas a salvo, inclusive com o retorno do Vasco. Isso é ótimo para o futebol, e espero que venha um período de ausência de hegemonia paulista, a fim de que a coisa toda tenha mais graça do que nos últimos anos.

Ah, já ia me esquecendo do mais impressionante: Souza e Bill fizeram golaços.

Quem disse que pontos corridos não é pura emoção?

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Só uma única servidão voluntária

O Amor é honesto, não diz as coisas pelas costas, não veste máscaras para agradar ninguém. O Amor é sincero, diz a verdade ainda que ela seja dolorosa, mas sempre oferecendo os braços abertos para o consolo de uma nova atitude da pessoa amada. Não existe imperdoável para o Amor: ele está sempre pronto para dar uma nova chance, pois acredita que as coisas podem sempre melhorar. O Amor se sacrifica, abdica das próprias vontades e esconde suas dores, às vezes se anula, só para cuidar da pessoa amada, ressurgindo com ainda mais fulgor em qualquer martírio.

O Amor sabe que não depende apenas de si, mas que sua existência está atrelada à pessoa amada, esteja esta próxima ou distante. O Amor tem início incerto, porém jamais acaba. O Amor luta as maiores batalhas sem nunca ser derrotado. O amor é caridoso, corajoso, altruísta, invejável, às vezes até ingênuo. Por mais maduro, sempre conserva a graça do primeiro encontro e dos sentimentos de uma nova primavera. O Amor nunca desiste, mas conhece o seu lugar. O Amor é intransitivo.

Enfim o amor é um idiota que só se fode.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Cinema transcendental

Desqualificar um adversário, sobretudo um que não pode ser desprezado com facilidade, por pura preguiça de ler a crítica ou por ser desafeto do crítico ou pelo objeto dessa ter sido algo de que você gosta, é um despreparo de quem se deixa levar demais pelo ego.

No caso estou falando de uma crítica que Caetano Veloso fez sobre Woody Allen.

Sou confesso idólatra do primeiro e acho o segundo um pé-no-saco.

Apesar da sabida veia provocadora, a qual, muito além de “só querer aparecer”, está intimamente ligada ao conceito tropicalista, a crítica é feita por alguém extremamente culto, conhecedor de cinema, e, veja só, fã de Woody Allen! Nada de não-ouvi-e-não-gostei: ele embasou muito bem suas opiniões (e estas são inalienáveis), e quem não concorde, que ignore ou mostre argumentos contra.

Porém tudo que as magoadetes fãs do cineasta fizeram foi tentar desqualificar o baiano com os batidos bordões “ele só quer chamar a atenção”, “Woody Allen nem sabe quem ele é”, “devia ter morrido em 1979”, “ele é gaydacu enrustido”, entre outros do mesmo nível abissal. Pouquíssima gente se deu ao trabalho de, a despeito de não gostar do Caetano, ler atentamente as críticas e tentar rebatê-las.

As pessoas se melindram por muito pouco. E assim o nível do debate cultural segue péssimo no país com o pior cinema do mundo.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Gente esquisita, normalmente inconsistente

Em alguns lugares você é, digamos, obrigado a ser falso às vezes. No ambiente de trabalho, por exemplo. É questão de sobrevivência profissional. Ou num ambiente familiar, como numa festa, cumprimentar até parentes com quem você não simpatiza (para dizer o mínimo). Mas ser falso por opção deve ser quase um vício. E, como todo vício, acaba trazendo prejuízos. A pessoa acaba criando um panteão mitômano de falsos amigos, de idéias distorcidas, de ilusões desfeitas.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

I owe a favor to a friend; my friends, they always come through for me.

[ “Onde foi que me perdi? Faria qualquer coisa para recuperar minha paixão pela vida, aquele fogo que me moveu e movia as pessoas na minha direção. A minha fúria era só um tempero naquela irresistível exuberância, não foi ela que afastou os outros de mim, mas a minha morte. Todos os dias me levanto, engulo uma xícara de café e vou para o túmulo. Estou me decompondo miseravelmente diante das pessoas.” ]

Na maioria das vezes as pessoas se machucam por pura fraqueza, por medo de elas mesmas se ferirem. Falta empatia, sobra temor. Porém não devemos deixar que isso - e é um caramujo convicto que está aos poucos aprendendo a sair da casca – nos endureça tanto a ponto de a gente não perceber nem dar valor às pessoas que, perto ou longe, nos querem realmente bem, fazem de tudo por nós. Sim, há gente com coragem, gente que não está interessada só em parasitismo, gente com sorriso sincero e brilho nos olhos. É por elas (e elas sabem quem são e conhecem a importância que têm na minha vida) que eu dedico esta postagem. Obrigado por estarem na minha vida e por me fazerem ainda crer em “gente, espelho da vida, doce mistério”.


[ "If you could only live my life | You could see the difference you make to me." ]

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Só vão te dar algum caixão sem alças

Nada mais triste que a fila do pronto-socorro. O pronto atendimento no Brasil é uma piada. Não existe, é só acaso, descaso, desentendimento. É feito amor de ilusão, de má retribuição, que nunca existiu. Mau atendimento pelo funcionário cujo salário é pago com seus impostos, não é nada de favor. Se você não estrebucha, não espirra sangue, na tem direito a exame, sequer ao olhar exangue do “doutor”. Não lhe cabe o leito apertado no velho quarto, mesmo que a dor que nem a de um parto. Então só lhe resta o peito apertado, sem jeito, com os olhos fundos e vazios da espera sem fim. Há um fim?

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

A solidão agora é sólida

É complicado conviver com outras pessoas. Às vezes desejamos viver a vida inteira sozinhos, sem interferências, outras, imploramos por alguém que ouça nossas histórias. O homem não é um ser social, como diziam os livros do Ginásio, e sim um ser solitário, cheio e traumas e neuroses, com os quais não sabe lidar. Por isso busca unir sua solidão com a dos outros, não por empatia, não por amor ou paixão, mas só para poder comparar um sofrimento que não pode ser medido. Sou pior que esse, melhor que aquele, igual àquele outro. E adoramos despejar nossas angústias sobre os outros, que parecem culpados por não nos fazer mais felizes. Clamamos aos pais, amigos, deuses, amigos, qualquer coisa, e tudo permanece igual. No final estamos sós, como sempre estivemos. Não quer dizer que isso seja bom ou ruim, simplesmente é. Porque é. Duro de aceitar / difícil de engolir? Paciência. Todo o resto é wishful thinking.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Não acredita no que vê, não daquela maneira.

Joãozinho acorda de manhã bem cedo
Com as costelas tremendo de frio e medo
E vai até a porta de seu barraco de madeira
Olha com desdém onde jaz ali à beira
Seu padrasto desmaiado de aguardente
Naquela cena tão comum e deprimente
E vai olhar o sol se levantar dos destroços
Pedindo com os olhos a companhia dos moços
Que saem logo bem cedo para trabalhar
Em obras, lixões, em balcões de bar.

A luz da manhã lhe arde os olhos pequenos
Com o cheiro do esgoto e seus tantos venenos
Ratos passando pelo chão batido de terra
Todos animais, vivendo na mesma guerra
Não tem nada para comer ou beber na mesa
Não há nada senão confiar na mesma reza
Que a mãe faz para as coisas melhorarem na vida
Para que a desventura resolva dar partida
Na carroça de miséria que puxa aquelas almas
Para tão longe de onde vem a calma.

Longe do grande estereótipo de preto
Mais longe ainda do caminho mais correto
Ele é seguido pela sombra criminosa
A saída, creia em mim, mais honrosa
Do que passar fome ou esperar ajuda
Do que ouvir o ronco da barriga muda
Que grita sozinha por uma intervenção
Da política que jamais traz solução
E das propagandas que anunciam promoções
Que requerem dinheiro aos borbotões.

Joãozinho fecha os olhos, imaginando
Outro mundo se lhe desvendando
Com a mesa posta, a família unida
Seus quatorze irmãos e muita comida
Seu pai fora da cadeia, com ele no colo
Verdes plantas nascendo num fértil solo
O perfume das flores, brinquedos de verdade
Nada de imaginar mais mortes e maldade
Mas os olhos se abrem, cheio de lágrima
E o livro da sua vida ainda está na mesma página.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Goodbye... and it's emotional.

Momento corneta: faz uns dez minutos que recebi a notícia de que André Santos (que já estava a fim de sair desde o meio do ano passado), lateral titular da seleção de Dunga, e o gladiador e mata-bambi Cristian, foram negociados com o pífio Fenerbahçe, da Turquia.

O mais legal é comprar o inútil do Morais por R$ 6 milhões, pagar R$ 175 mensais ao Souza, e, enquanto isso, vender dois jogadorzaços e ainda menosprezar Herrera, que custaria módicos R$ 2 milhões.

Não é à toa que Andres Sanchez, a despeito de ter mandado muitíssimo bem ao contratar Mano Menezes, não nega seu passado incompetente de vice- do nefasto Dualibi e quer fazer dinheiro vendendo jogador bom e comprando cabeça-de-bagre.

Agora é ver como o Mano vai repor essas duas importantíssimas peças. E, no mais, valeu André Seleção, valeu Cristian Gladiador.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Wake up: time to die!

Uma das poucas coisas nas quais Sartre e Freud concordavam era sobre o fato de as relações humanas serem impossíveis, pois, cada um ao seu modo, os sexos idealizavam a si mesmos. Ainda que mais do que a outrem que os completassem, e, por isso, nada se acertava jamais. Estaríamos todos fadados ao fracasso pelo instintivo egoísmo de procurar-nos outros nós mesmos, e não o que nos completasse.

Vou falar sobre suicídio, Sísifo à parte, que é um tema caro (vendido barato) a toda nossa sociedade ocidental. Todo mundo tem medo, receio, tabu justamente por ser um ato que de nunca que as pessoas fazem apostas indevidas umas sobre as outras, e se decepcionam e carregam pessoas inexistentes quando tudo falha. O inferno é a monotonia, por isso todos se arriscam pateticamente em empreitadas fracassadas, como pusessem pular as chamas eternas e justas da condenação. Abismo que atrai sempre outro abismo.

Investimos nas pessoas e elas se matam, como assim? Que fracasso, que ingratidão!

Dói-nos saber e todo o esforço em enquadrar tais pessoas na sociedade fracassou. Por isso transformamos tudo em tabu: quem abdica da própria existência é proscrito, maldito, desdito tampouco merece menção em qualquer sufrágio; aos suicidas, um círculo infernal terrível, sem esperança de redenção, muito menos reabilitação em terra com os pertences e valores deixados. Matar-se e covardia, derrota, desterro. O certo é saber que o certo é certo.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Eternidades da semana

Como naquele infame verso do último disco do Frejat, “dar um photoshop na realidade” é o que a imprensa resolveu fazer. É o New New Journalism: sob a desculpa de que “sabia que ia desafiar as convenções do jornalismo“, o repórter ignorou, isso sim, a ética, a vergonha na cara e o bom senso, no afã de querer “dar furo” numa época em que a internet engole os impressos na questão da velocidade. Que tal os assinantes ganharem um aplicativo NoticeYourself!, com temas-chave, daqueles “de gaveta” e umas fotos para serem editadas no PaintBrush?

Eu queria morar numa favela: Serra e Kassab, sempre antenados com as incríveis políticas sociais do PSDB/DEMo, não satisfeitos com as rampas antimendigo, o extermínio de moradores de rua por policiais (lembram?), o sucateamento dos albergues, agora os moradores de rua são expulsos da cracolândia original, sob a pretensa revitalização da região, apenas para instalarem suas carcaças umas quadras acima, com os mesmos problemas. Com a direita brasileira, e a bela classe média que a elege, é assim: se não estou vendo, não é mais problema meu. E o Haiti não é só aqui: todo reduto de viaduto tem um muito de campo de concentração. Ser notícia velha embrulhada no jornal.

No Brasil, 11,5% das crianças são analfabetas. E o pessoal preocupado em legalizar a maconha.

Júlio de Mesquita Filho, o mesmo do infame editorial “Basta!”, anti-Jango e pró-ditadura, é celebrado como modelo de caráter.

Vendo televisão, descobri que a dignidade vale uns R$ 200 para fingir que namora alguém, que você dá dinheiro ao pastor, e, num passe de mágica, fica com mais dinheiro, e que a felicidade é uma mão de tinta numa parede descascada. Ah, e que todas as operadoras de telefonia funcionam direito, os diretores de arte das agências são extremamente criativos nos conceitos, que, com dinheiro, uma cópia barata vira uma cópia cara.

terça-feira, 30 de junho de 2009

Pra fazer sucesso, pra vender disco de protesto, todo mundo tem que reclamar

Escrito com Shepones

Não interessa contra o que ou contra quem. Com razão ou sem razão, sabendo do que se fala ou não, o negócio é reclamar geral. Eis as melhores músicas de protesto já feitas:

Até Quando Esperar? (Plebe Rude)
Capitulo 4, Versículo 3 (Racionais MCs)
How Many Tears (Helloween)
Like A Song (U2)
Masters Of War (Bob Dylan)
Perfeição (Legião Urbana)
Redemption Song (Bob Marley)
Selvagem? (Os Paralamas Do Sucesso)
Todas do Rage Against The Machine
War Pigs (Black Sabbath)

Não gostou? Protesta, ué.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

I was looking for a job and then I found a job and Heaven knows I'm miserable now.

Onze sugestões de empreendimento para os recém-desprofissionalizados jornalistas

Escrito com Shepones

01. Vender Avon
02. Fazer malabares no semáforo
03. Agenciar prostituição infantil no Ceasa
04. Plantar maconha no litoral da Bahia
05. Ser porteiro de bordel na Augusta
06. Revender tele-sena vencida
07. Ser homem-sanduíche de "Compro Ouro" no Centrão
08. Vender pomada da banha do peixe-boi da amazônia no trem
09. Fingir-se de mudo e vender adesivo do Piu-Piu no bumba
10. Oferecer-se como cobaia para teste de novos medicamentos
11. Preparar tapiocas no Centro De Tradições Nordestinas (CTN)

terça-feira, 16 de junho de 2009

No fim da tarde, a sensação da missão cumprida

Engraçado como as pessoas se interessam mais pelas eleições do Irã do que pelas do Brasil. Vide os escroques que temos elegido, especialmente em São Paulo.

Lembrou-me 1999, no primeiro ano da faculdade, quando uma mina me abordou no corredor pedindo uma doação para os refugiados de Kosovo. Respondi: ah, legal, mas por que antes vocês não arrecadam alguns mantimentos para aquelas famílias que moram no viaduto que fica a 100 metros daqui?

Exceto quando se trata da África (porque aí ninguém liga mesmo) as pessoas parecem ficar com a consciência mais tranqüila quando “ajudam” sem se envolver.

E vale notar que esses supostos interesses vão e vêm ao sabor da mídia. Cada semana é uma comoção diferente que assola essa “gente honesta, boa e comovida”. Aposto um picolé de limão que os persas serão esquecidos, em prol de um novo assunto (seja um moleque arrastado pelas ruas ou uma cantora gorda internada por estresse) mais rapidamente do que você consegue dizer “Mahmoud Ahmadinejad”.

Ah, vou doar roupas velhas pra Santa Catarina, adotar financeiramente um moleque da LBV que nunca precisarei ver na vida e colocar no Orkut um avatar “Free Palestina” (mesmo que eu sequer saiba apontá-la no mapa).

Porém, quando o pivete da esquina aparece, fecho o vidro. Quando vejo o mendigo dormindo sob uma marquise, viro o rosto.

Dou minhas ofertas na igreja, mas não sei amar o próximo. Só o distante.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

The dark side of the meal

Manual De (Má) Conduta Para Funcionários do Mc Habob's

01. Tire esse sorriso do rosto já! Um funcionário do Mc Habob’s jamais sorri. Ele não tem motivos para isso.

02. Treine olhares impassíveis, cheios de blasê, para atender os clientes.

03. Não preste muita atenção nos pedidos: faz parte do charme do lugar receber lanches errados, e, ao reclamar, ouvir algo como “tenho certeza de que você pediu isso”.

04. Treine uma cara de hiena faminta para quando o cliente ameaçar não pagar os 10%, ainda que seu atendimento seja do nível de Auschwitz.

05. Quando alguém reclamar que o pedido está errado, como um refri com pedras de gelo o qual o cliente alega ter pedido sem elas, insista silenciosa e obstinadamente empurrando o copo para ele. Mostre sua força de vontade.

06. Treine lutinha com esfirras na cozinha, acertando os outros funcionários (acintosamente, pra que os clientes vejam) e arremesso de beirute com ovo gosmento no prato do freguês, de modo que o lanche dê uma dropada tipo half-pipe nas bordas.

07. Use o tratamento “senhor” a cada três palavras, ainda que não faça sentido, só para irritar o cliente e fazê-lo se sentir um número sem importância.

08. Desconte sua insatisfação com o trabalho escravo e o salário de fome despejando fluidos corporais nos lanches e nunca lavando as mãos após coçar a bunda.

09. A primeira regra do Mc Habob’s é que você não sabe do que é feita a carne do Mc Habob’s.

10. O queijo eu te conto: é feito do mesmo material da caixinha em que vêm os lanches.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Quem vê caramujo, não vê coração.

Uma noite com o caramujinho guitarrista (II)


Após o ensaio de sábado à noite, o caramujinho foi convidado pelos outros integrantes, as lesmas, para curtir uma balada. Gastrópode que é, tem preguiça de ficar fora do casulo a noite toda. Mas insistiram tanto que acabou aceitando. Foram a um pico que, diziam, teria open-bar.

_Open-bar? Por que não disseram antes, vamos, suas lesmas!

Tá certo que esse termo é sinônimo de roubada, visto que espanta as caramujinhas, atrai caracóis bêbados e só contêm bebidas que nem um visigodo que levou fora da concumbina aceitaria.

Mas aquilo era demais pro caramujinho.

O interior parecia que havia pegado fogo, sido atingido por um aerólito e depredado por hordas de ETs belicosos.

O banheiro era o círculo infernal ao qual Virgílio não teve coragem de levar Dante, com medo de perder a amizade. Devia haver ali cepas de todas as doenças mais mortíferas, de varíola a ebola, passando por peste negra e gripe espanhola.

O open-bar era composto de bebidas altamente nocivas, certamente aparentadas do zyklon-B, do BHC e do ácido muriático. Achou que o bar só estava open porque o Conselho de Segurança da ONU não teve coragem de ir até lá verificar as armas de destruição em massa.

Desejou que aquelas lesmas secassem num cimentado em dia de sol.

No palco, em meio a um calor que deixava o ar mefítico irrespirável com seus miasmas, uma banda cover assassinava Stone Temple Pilots com solos fora de escala e vocal fraquinho embromando no ingrêis.

_Vou embora.

(Leia com sotaque bêbado)

_Vai nada, caramujinho, fica aí, vai ter mais bandas, tem bebida de graça.

_Suas lesmas, eu não vou beber esses venenos. Tô indo, é sério.

Foi embora.

Tinha um caracol em coma alcoólico, tentando ser reanimado pelos amigos. Outro vomitado na escada, perto da porta.

E não era nem uma da madrugada.

Diga-me o que comes, e eu te direi que estás fudido.

As piores coisas que já passaram pelo meu combalido estômago:

05. Dogão do Sesc Itaquera: no geral os rangos do Sesc são bons e baratos, mas o hot-morte dessa unidade é feito com o pão que o Diabo amassou e salsicha de pneu e gato atropelado. E ainda deu dor de barriga no dia seguinte.

04. “Cerveja” Liber no Pacaembu: embora nos arredores você possa comer um incrível e tradicional sanduba de pernil, um suspeito sanduga de lingüiça feita com algum animal ainda não registrado pelo Ibama, e tomar de cerveja a rabo-de-galo, dentro do estádio a hipocrisia reina: vendem-se hambúrgueres horríveis, sorvetes semiderretidos, refrigerantes genéricos do tipo Carrefour-Cola (vendida como “Pepsi”) e a temível Liber, que tem gosto de pão velho molhado. Pior que isso só o Corinthians de 2006-2007.

03. Hambúrguer do Lulu: para um domingão frio e aziago no Pacaembu, durante um (ótimo) show mal divulgado do Lulu Santos, um hambúrguer frio e aziago, saboroso como o isopor no qual estava acondicionado.

02. Coxinha do Oldboy: devia estar sem sal. Deve ter sido de propósito, coisa de funcionário que pretende ferrar a imagem da empresa. O salgado ingerido na Uno & Due da Galeria Gemini, antes da sessão de Oldboy, foi como mastigar um saco de cimentcola.

01. Dogão do U2: não foi um dia fácil. Para ver a melhor banda do mundo pela segunda vez, enfrentei trampo o dia todo, maratona num puta calor até o Morumbi, grandes filas para entrar e sair, chuva na hora de ir embora e uma lotação cheirando a hiena velha. Mas nada supera do cachorro-quente deglutido na porta de entrada: uma salsicha feita provavelmente com garrafas PET recicladas num um pão ázimo que sobrou da Santa Ceia. E custou caro.

Quem disse que caramujo não tem coração?

As aventuras do caramujinho jornalista (I)

Era uma vez um caramujinho que fazia frilas.

Um dia uma borboletinha, aconselhada por outra borboleta, ligou para o caramujo e lhe ofereceu um freelance que ela não conseguiria fazer a tempo.

_Olá caramujinho, tudo bem?

_Tudo bem, borboletinha, e você?

E, numa cordial conversa, os termos do trabalho ficaram acertados, com todos os contatos e todas as coordenadas.

Faltava falar com o cliente, o besouro rola-bosta.

_Olá rola-bosta, tudo bem?

_Tudo bem, caramujinho, e você?

O besouro explicou que era um trabalho insano, muita coisa em pouco tempo. “Pelo menos poderei cobrar bastante”, pensou o ressabiado caramujinho.

No dia seguinte o caramujinho, mesmo tendo acordado com uma forte dor de barriga, vômito e enxaqueca, decidiu cumprir seus compromissos. Deslizou até o médico, onde tinha consulta marcada havia tempos. Sendo um molusco pobre, com casca de segunda mão, que utiliza o SUS, ficou esperando um tempão, mesmo com hora marcada. De lá, escorregou até o terminal de ônibus, onde engoliu a segunda pior coxinha de sua vida (fez até uma nota mental de listar depois os piores rangos que já comera), e seguiu para o longínquo cliente.

E o caramujinho foi. E foi. E foi. O lugar parecia nunca chegar. Que jardim distante! De terminal em terminal, de ônibus em ônibus, o pequeno molusco morria de calor dentro de sua carapaça que ardia sob o sol daquela tarde abafada. Desceu já atrasado, às pressas, quando viu que o enésimo ônibus que pegara não chegaria onde deveria. E o caramujinho andou. Andou. Andou. Mal havia muco suficiente para se arrastar por aquele caminho imenso, desconhecido, cheio de perigos. Resolveu perguntar a todos que apareciam

_Olá centopéia, onde fica este endereço?

_Não sei, caramujinho. Por que não pergunta àqueles cupins?

_Olá cupins, onde fica este endereço?

_Não sabemos, caramujinho. Por que não pergunta àquele louva-a-deus?

_Olá louva-a-deus, onde fica este endereço?

_Não sei, caramujinho. Por que não pergunta àquela aranha?

O caramujinho se sentiu perdido num imenso formigueiro, sem saber aonde ir. Por sorte sua joaninha-madrinha lhe telefonou, procurou o endereço na internet e corrigiu a rota do pequeno caramujo, já tão cansado e apreensivo.

_Olá caramujinho, você já andou tanto, mas agora nem está tão longe. Continue à direita, naqueles arbustos.

_Obrigado fada-joaninha. Serei eternamente grato.

Mas o pior estava pior vir: quando chegou à esquina do jardim, viu um imenso vale que deveria atravessar. Era tão colossal, e o caramujinho já estava tão cansado e atrasado, que só conseguiu pensar no Ice Blue, dos Racionais MCs, falando, em A Vítima:

“MANO, FOI UM ARREGAÇO!...”

E o caramujinho desceu o vale infindável.

Desceu.

Desceu.

Desceu.

No ponto mais fundo, sentiu o ar faltando como se estivesse no fundo do oceano.

Subiu.

Subiu.

Subiu.

O vento quente lhe ardia nos pulmões, o suor deixava seu corpo ainda mais escorregadio dentro do casco. Achou que ia infartar, de tanto que o coração palpitava.

Chegou ao local, com saudade de um banho relaxante em seu cogumelo, na companhia de sua caramujinha.

Suou de derramar cascatas enquanto esperava o cliente, sob os olhares enviesados da secretária taturana.

Quando finalmente foi atendido, naquele ambiente impessoal de grande fábrica, e foi formalmente apresentado pelo rola-bosta ao décimo terceiro trabalho de Hércules, aquele que ele recusou porque não ia dar tempo.

_Quanto você cobra por isso?

_Dez flores murchas.

_Tudo isso? Só posso pagar três.

_Esse preço é ridículo.

_O outro caramujo fez por duas flores. E nem estavam murchas.

_É, e o trabalho ficou uma merda.

_Ah, faz um desconto, vai. Quatro flores, ta bom?

O caramujinho pensou em torturar aquele ganancioso rola-bosta e todos os seus familiares. Mas havia viajado tanto até ali, o dia havia sido tão cansativo, que acabou aceitando.

Na saída, tentando minimizar seu prejuízo pessoal, inquiriu o besouro pão-duro:

_Pô seu rola-bosta, você me ensinou o caminho errado, não é possível. Tive que deslizar tanto que até me faltou muco pra voltar agora. Atravessei um longo jardim, canteiros estranhos e um vale gigantesco... e ontem você disse que era pertinho!...

_Ah, você veio de ônibus? O caminho era pra vir de carro! De ônibus tem um ponto ali pertinho, na esquina.

¬¬

Sentindo-se um caramujo prostituído, passou num boteco para comprar uma cerveja e dar uma conferida no final da Champions League.

Achou um velho com uma camisa do Corinthians na esquina. Perguntou a ele se o ônibus desejado passava ali, para então emendar:

_Hoje tem Coringão, hein? Dois a zero no Vasquinho?

_Opa, hoje a gente ganha fácil.

Ele jamais havia puxado conversa com um estranho, em toda a sua lenta vida. Alguma coisa havia mudado naquela tarde baça, e era a expressão estóica de um caramujinho que acreditava mais em si.

E a noite chegou como um manto alvinegro, pousando suavemente sobre aquele coração exausto.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Tr00 be or no tr00 be (II)

Após o sucesso da minha franquia profana e blasfema da loja tr00, aguardem o lançamento da minha plataforma tr00 para o microbblogin’ e a comunicação entre os reais guerreiros pagãos satânicos misantrópicos niilistas: o Tr00witter.

Em vez daquele passarinho boiola e cristão que remete ao Espírito Santo, teremos um corvo de Odin (ainda não decidi entre Hugin ou Munin) envolto nas chamas e sob a escuridão das planícies desoladas do Hades.

As funções:

[Tomb] Porque tr00 não tem “Home”, e sim perambula pelos cemitérios a fim de misantropicar e tirar fotos posando entre as cruzes.

[Artefato] porque twitt é um som nada tr00; um blackmettaler manda artefatos contra os fracos cristãos e poseurs que infestam a cena.

[Hail] guerreiros de Lúcifer saúdam outros guerreiros, não dão “reply”.

[FanzineMimeografado] RT não, pô. Tr00 que é tr00 só passa som via fanzines tranqueira que só ele e o primo lêem.

[Quest] É mais épico que “Search”, combinando mais com as buscas solitárias dos guerreiros pelas vast paganlands.

[TrendTopics] Você não é nada kvlt, hein? Preciso citar Behemoth (encarte do Grom): “Black metal is not a trend, it's a cult”. E o fato de eles mesmo terem migrado para o death metal no disco seguinte não vem ao caso.

[Stalking_Me] Porque reais da cena profana não seguem ninguém, são misantrópicos e individualistas, esqueceu?

[Hatred tr00wits] Tr00 não favorita, porra!

[Direct scourges] Tr00 vai direto ao ponto, dando tiro na cabeça e facada nas costas. Sem frescura.

A pergunta será: What are you profanating?

Exemplo de possíveis postagens:

@ImpalerSodomizer #follow @SatanicLust666

@Euronymous #unfollow @VargVikernes

@ChristCrusher: alguém aí tem dicas para um bom corpse-paint? hipoglós ou minâncora?

“This account no longer exists (tr00wittercídio)”: vale para @Dead @JonNödtveidt @Cernunnos @Grim

@Sventevith: hail warriors! Quem vai ao #TOC (tr00witteiro on cimita) hoje?

@Hellhammer_90: Tô indo pro Inner Circle. #beijosmeempala

Venha destruir a civilização judaico-cristã em 140 caracteres você também!

segunda-feira, 25 de maio de 2009

And thus, we shall cheat Deah.

Ontem passou no Domingo Legal (OK, não riam) uma matéria sobre corpos incorruptos, múmias e igrejas ossudas, com catacumbas repletas de ossadas que formam desenhos lúgubres. Tem uma matéria que a Globo fez sei lá quando, e colocou ontem no site do Fantástico porque, provavelmente, ficou incomodada com a audiência do concorrente. Por ele, dá para ter uma idéia. À parte da morbidez fascinante das múmias, que mostram nossa impermanência, jogando-a em nossa cara da forma mais rude. Mas o que chamou a atenção é que, nesse espetáculo mortuário que a Igreja fez desse montante de cadáveres, num gigantesco memento mori, é que o sentido original daquelas mumificações foi subvertido. À parte dos corpos de santos, que entram numa questão de fé versus ciência do qual não pretendo falar no momento, pois configuram outro aspecto do necrocristianismo, chama a atenção que todas aquelas ex-pessoas pretendiam se perpetuar por meio da mumificação, e hoje são justamente prova do contrário: a de que seremos inevitavelmente esquecidos. Hoje ninguém mais conhece aquelas pessoas, nenhum contemporâneo existe mais, estão todos igualmente mortos. Ninguém engana a existência, tão pouco o limite dela. Carpe noctem.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

E sei que a poesia está para a prosa assim como o amor está para a amizade, e quem há de negar que esta lhe é superior?

Poesia é mais fácil que prosa: tem, ao mesmo tempo, mais e menos regras. Comporta mais formatos, permitem-se imagens livres, deixa livre qualquer interpretação. Escrevo versos como quem vive, como quem se cura de uma loucura qualquer. Já a prosa é doida, doída, densa, tensa. Ainda que possam se confundir, se tocar, se lamber e se beijar, numa cópula incestuosa, visto que são irmãs. Versificar me faz bem, prosear me faz mal. No entanto acendo velas a ambos, deus e diabo, numa comunhão profana do mesmo altar literário. Versos brancos, negros, livres, cativos; sonetos, odes, elegias, rondós. Tudo cabe na imensidão da poesia. Todas as imagens (im)possíveis já estão (d)escritas nas entrelinhas das estrelas em cada rima. A prosa já exige uma exposição maior, não permite a insinuação da poesia, desnuda logo, à vestes rasgadas com sofreguidão, o corpo envergonhado dos desejos inconfessáveis. Ainda não esqueci a promessa horrível. Sabia que a música é a entrega que mais se aproxima da literatura? Você poetiza nas canções e proseia nos interstícios. Agride a língua, como numa mordida léxica que arranca sangue dos significados, enquanto arranha as cordas em sons inexistentes. Êxtase blasfemo: quem possui a arte não precisa de nenhum deus. Quem é possuído por ela, torna-se o próprio demônio. A Queda se renova em cada criação.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Under Jolly Roger

Tentei vender minh’alma
Mas Deus não quis comprar
Já estava pirateada
Era só downloadear

Meus sonhos de toda a vida
À venda no camelô
Nos iPods, sem saída
Nem sei mais onde estou

Confesso que foi vacilo
O Diabo já ia comprar
Mas, bem fiel ao meu estilo
Demorei pra entregar

Quem sabe no eBay
Eu consiga um bom preço
Se bem que até já sei
O pouquinho que mereço

Pois ninguém vai dar dinheiro
Por uma alma na metade
Pelo que já está inteiro
Em qualquer canto da cidade.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

¿Where do they all belong?

Corredor do posto de saúde: atendimento atrasado em algumas dezenas de minutos, vaivém de pacientes e impacientes, todos misturados em doenças e especialidades médicas, entre portas fechadas e cadeiras desconfortáveis para a espera. Uma senhora de sessenta e tantos anos, vestido marrom, cabelos brancos e mau cheiro que denunciava a falta de banho havia alguns dias, adentrou o ambiente. Nervosa, transtornada, perturbada, disse à recepcionista, com ânsia, que precisava falar com a psiquiatra. Indicaram-na um banco para esperar, junto à porta de Saúde Mental. Quando a sala ficou aberta, mal o paciente que lá estava saiu e a senhora entrou falando que o marido havia morrido no dia anterior, o neto havia roubado seu carro, o banco, cancelado sua conta, e não dormia ou comia desde o enterro. Com um papel que, segundo ela, era a certidão de óbito do marido, pediu à médica algo que não consegui entender, dada a confusão da fala da senhora. A psiquiatra, consternada, indicou-a a assistente social, que, supostamente, ajudá-la-ia. Antes disso, contou a mesma história meio sem nexo a um senhor que esperava atendimento, acrescentando, entre outros aparentes devaneios, que não saía de casa com medo de a roubarem, e que havia perdido um brinco quando se inclinou no caixão à cova. Ao entrar na sala da assistente social, que pedia à psiquiatra que prescrevesse algum calmante para aquele caso, a mulher cujo odor já ocupava todo o posto virou-se para mim e disse: “Você vê? A vida tem dessas coisas”.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Vamos Tesouro, não se misture com essa gentalha.

Síndrome de indie é uma coisa que enche o saco. Antes se restringia à música, com os filhotes de Álvaro Pereira Júnior se regozijando em proclamar como salvação do rock a mais recente banda do interior da Islândia, para, meses depois, com falso blasê, mostrar desinteresse só porque não é mais só ele e seus dois amigos nerds rancorosos que ouvem o que ele mesmo divulgou.

Como agora, devido à mp3, fica muito mais fácil para todos ouvirem de tudo, sem a necessidade de gurus, o câncer de indie melindrado se arrastou para a internet: as redes sociais têm, freqüentemente, chororô dos chamados early adopters (nome frufru para nerds/geeks) ante a popularização do Orkut, do Facebook, do MySpace, do Twitter, etc., não sem completar a mensagem com os bordões “isto aqui era melhor há dois anos, quando não havia muitos brasileiros” e “maldita inclusão digital”.

Cada vez que a empregada sai do quartinho dela e passa em frente à sala de estar dos patrões, é um chilique, um incômodo, uma coceira que revela todos os preconceitos dos caboclos que desejam ser ingleses, para usar mais ou menos um termo do Cazuza.

A vocação de jeca que acompanha a classe média brasileira não decepciona jamais.

terça-feira, 10 de março de 2009

Eternidades da semana

1. O arcebispo de Olinda foi estúpido em externar à imprensa as convicções da religião que representa e escroto em tentar levar o caso à Justiça. Mas foi coerente com os preceitos do catolicismo. Os católicos, ou os que se dizem assim, é que definitivamente precisam rever seus conceitos ante à modernidade. A Igreja não.

2. O nível do futebol atual está tão baixo que um moleque de 20 anos, um gorducho baladeiro e um encrenqueiro que joga partida sim, partida não são os destaques do esporte nacional. Definitivamente o Brasil não dá mais conta de exportar craques. Série A na Itália e Espanha, série B na Alemanha e Rússia, série C aqui. Desafio Ao Galo no Qatar.

3. O brasileiro se identifica com Ronaldo porque ele é batalhador, meio burrinho, gente-boa, humilde, faz umas merdas com dinheiro na mão mas não perde a sensibilidade. Eu mesmo havia decretado seu fim antes da Copa de 2002, estava cético com esta volta aos campos no meu time, mas, com a bola no pé, ele é fenomenal.

4. Otávio Frias Filho, apesar do falso mea culpa quanto ao termo ditabranda, insiste em comparar ditaduras com base no número de vítimas do regime. É a velha tática direitista da contagem de corpos. Mais ridículo que isso, só a cobertura insípida do próprio jornal quanto ao protesto em frente a Folha. Um quarto de página perto do ombundsman, bem ali onde ninguém lê, embaixo de outras notícias irrelevantes.

5. As matérias da grande mídia sobre os fenômenos da internet são constrangedoras. Sempre com enorme atraso, sempre entrevistando as mesmas pessoas que não sabem nada, sempre com aquele jeito Folhateen de falar coisas óbvias sem se aprofundar em nada, e sem jamais compreender realmente o objeto das matérias. Os cadernos de informática dos jornais, por exemplo, deviam parar de encher as páginas de matérias pagas e releases e contratar jornalistas antenados que corram atrás das novidades antes que estas morram de velhice.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Half a person

Esta semana, por ter ido à balada com o Femônemo, da qual este voltou para a concentração bêbado, atrasado e chiliquento, o diretor técnico do Timão, o ex-jogador Antônio Carlos Zago não agüentou a pressão e pediu demissão. Dei graças a Zeus, afinal nunca quis que esse racista filho-da-puta pusesse os pés no glorioso Parque São Jorge, muito menos dirigisse alguma coisa no meu Sport Club Corinthians Paulista de Glórias Mil.

Assim que a imprensa deixou de achar interessante divulgar o racismo do Antônio Carlos, isso perdeu a importância. Quando ele veio trabalhar no Timão, ano passado, ninguém na imprensa comentou sobre sua procedência, algo imperdoável, ainda mais num meio no qual o racismo vem crescendo.

Não posso esquecer seu passado negro (ops) por, além de isso não ter feito tanto tempo assim (foi em 2006), ele nem pagou pelo crime fora do âmbito futebolístico (pegou apenas 60 dias de suspensão), nem demonstrou arrependimento. Pior: em vez de um mea culpa, veio com o aquele papinho de “vocês me interpretaram mal”. Cazzo, não é mais digno dizer “fiz merda, estava de cabeça quente, foi mal”? Só se desculpou quando acuado pelo Ministério Público.

Enquanto isso, aposto que meio mundo releva tudo isso com base no pensamento popular que cria um dualismo entre o pessoal e o profissional. Sabe aquele lance de “ah, ele é um chefe cuzão, mas como pessoa ele é legal”? Não, ‘tá errado! Se ele é torpe 8h/dia, não pode ser boa pessoa. O caráter de alguém é posto à prova o tempo todo, não só em determinadas circunstâncias. Valores não podem ser relativos (“Vamos ver, sou ser gente-boa com meus amigos e um carrasco com minha família.”). Isso é um afrouxamento estúpido, uma permissão que a sociedade se dá para poder gostar de gente que não presta e poder dormir sem peso na consciência.

Mas o pior de tudo isso é quando dizem “Mas fulano, enquanto pessoa”... ah, e enquanto latinha de cerveja, enquanto mula-sem-cabeça, enquanto batata-doce, ele é o quê? Quando ele deixa de ser uma pessoa?

Hmmm... talvez quando seja racista, né.

Gone

Comenta-se hoje aqui no meu bairro que um conhecido senhor da rua de cima, de 95 anos, inclusive amigo do meu pai, daqueles vovôs bonachões, de bem com a vida, de grande família e muitos amigos, foi informado esses dias pelo médico de que estava com um câncer na próstata em estágio terminal. Recebeu a notícia placidamente, chegou em casa, colocou algumas roupas em uma bolsa, redigiu um bilhete dizendo que não queria dar trabalho a ninguém, deixando-o à mesa junto com os cartões de crédito e o do banco (com R$ 2.000 na conta) e saiu. Mesmo com os cartazes nos postes de toda a região estampando sua foto e pedindo informações, ainda não se sabe o paradeiro dele.

segunda-feira, 2 de março de 2009

To live is to die

Nunca perdi ninguém realmente próximo e querido. Já perdi colegas, parentes, animais de estimação, já vi gente morrendo tragicamente na minha frente, já escapei eu mesmo da morte rente aos calcanhares, mas não sei o que é a morte. A morte de verdade, não a nossa própria. Porque, como disse Epicuro, essa não vale, porque só chega depois que a gente vai embora, não há um encontro. Ou, como disse Schopenhauer, é o mesmo que antes de termos nascido; simplesmente um grande nada com o qual não precisamos nos preocupar. Mas nenhum filósofo lidou decentemente com o luto: morrer de verdade é senti-la enquanto ainda estamos vivos. É o imponderável de a pessoa amada definhar e morrer sem que possamos fazer nada. Quando se ama a dor do outro é muito pior que a nossa própria. A pior dor é perder algo/alguém e ter a certeza de aquilo ser para sempre. Mas agüenta-se, e, cedo ou tarde, percebemos que a vida continuou sem que percebêssemos. Suportamos toda dor, menos a última. Até lá, é carregar a pedra.

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Dia Anterior

A vida sempre acaba, e não é uma vez só. É como se tudo que fizessemos embolorasse logo depois, fazendo que com esquecêssemos do gosto do que comemos. Fica só a lembrança daquele cheiro de mofo e aquela aparência decrépita, de coisa passada do ponto, de oportunidade perdida, coisa mal aproveitada. Por que eu bebo a vida mesmo? Afasta de mim! A vida acaba ficando meio janta requentada, café de vó (muito doce, fraco e escaldante), pão amanhecido. Você já não sentiu ressaca da existência? Os dias vão passando e parece que a cerveja sempre acaba, e nas horas improváveis, quando a adega do bairro já fechou. A esperança é um engradado vazio, só decepção e inutilidade. Você está faminto, pega o pão e não há fatias o bastante de salaminho para preencher o sanduíche. Coito interrompido, banheiro sem papel, festa só com vodca barata, visita da sogra. A existência é o óbvio desagradável, a surpresa de má-fé, a surpresa perversa. É despertar continuamente dos sonhos bons. Ano inteiro de quarta-feira-de-cinzas. A vida é sempre o dia anterior.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Tr00 be or not tr00 be

O mundo, definitivamente, não é mais tr00. Foi-se o tempo em que se trocavam fitas K7 (cópias das cópias das cópias), camisas de manga longa de bandas desconhecidas eram feitas sob encomenda, fanzines eram mandados pelos Correios, contatos eram feitos por carta-social, moleques eram intimados por vestir determinadas bandas e a Galeria do Rock era um antro de podridão onde metaleiros fedegosos arrumavam briga, consumiam drogas (e não estou me referindo às coxinhas peludas e esverdeadas do boteco) e corriam risco de morte nas escadas rolantes quebradas.

Hoje o mundo é outro: não adianta dizer “não passo som pra prego”, pois tudo está disponível na internet. Cartas, fanzines e fitas K7 são relíquias de passadistas. A Galeria tem elevadores, um bar novo, ambiente familiar, seguranças, plantas e lugar pra sentar.

Se você for intimar alguém, vai ter que pedir pra mãe dele, que provavelmente estará ao lado. Os emos são maioria. Os headbangers devem até tomar banho. Tem saldão de CDs do Burzum e do Emperor.

Alguém precisa tomar uma atitude.

Como ficam os valorosos guerreiros do metal que fizeram amizades pela seção de correio da Rock Brigade, gastaram fortunas em CDs importados da Noruega, têm bootlegs do Amen Corner e vinis do Bathory, fizeram uma força danada pra tentar gostar dos blips, tóins e teclados de churrascaria do H418ov21.C,do Beherit, ou de qualquer coisa do Neptune Towers, e passaram horas tentando distinguir se aquele som de besouro era chiado da fita ou a guitarra da primeira música no split Darkthrone & Mayhem (o inacreditável The True Legends In Black)?

Pois eu vou comprar uma daquelas lojas de peruca da Galeria e fazer a inefável The Tr00 Store, uma loja para os verdadeiros bárbaros pagãos do metal negro. Uma catacumba musical que fará a Helvete, do Euronymous, parecer a Daslu.

Os funcionários, que serão recrutados com base no histórico de profanação de cemitérios e queima de igrejas de cada um, deverão usar corpse-paint + couro + tachas + armas medievais, e usar pseudônimos como Necroskullchruser ou ImpalerBlasphemerMutilator, dividir-se-ão nas tarefas “ficar na porta intimando os passantes” (“Vai comprar ou não? ‘Cê conhece esse som ou é um falso que vai sujar a cena underground? Qual o nome da mãe do Nocturno Culto?") e ficar de braços cruzados atrás do balcão, com cenho franzido, fingindo que está lendo Nietzsche ou algumas runas vikings (o máximo que os funcionários devem dizer uns aos outros é “Hail!”), com o som ambiente tocando remixes de 90min para músicas do Abruptum e do MZ-412 em loop, no último volume, inviabilizando qualquer tentativa de conversa e causando náusea, dor de cabeça e convulsões em qualquer falso que permanecer mais de três minutos na loja. Só serão vendidos K7s ("Artefatos!"), camisetas de bandas ("Hordas!") do interior da Transilvânia e fanzines mimeografados, a preços escorchantes. O logotipo deverá usar letras horrorosas e disformes, acrescido de quantos pentagramas e quantas cruzes invertidas forem necessárias até que o conjunto seja absolutamente incompreensível.

E as perucas da loja antiga? “Escalpos de cristãos”, ora.

Será que meu empreendimento terá sucesso?

Stay tr00.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O unfollow é a serventia da casa

A moda agora são posts de "blogueiros formadores de opinião" (leia “palpiteiros almost famous”) dizendo o que é certo e errado na twittosfera (inventei agora): siga fulano, não siga beltrano, não prolongue as conversas, linque isso, não linque aquilo, aumente seus seguidores assim, não saia adicionando todo mundo por isso ou aquilo, preencha seu profile, coloque uma imagem estilosa, veja quem são os twitteiros influentes, saiba tudo sobre a Campus Party (“eu vou e você não”),vejam como tem um monte de gente me seguindo e não sigo ninguém, acessem meus linques para posts pagos e notícias de segunda mão, e por aí, infelizmente, vai.

Isso aconteceu com os e-mails, com os blogs, com os flogs, com o orkut; sempre tem alguém querendo ditar regras, criar tendências, decidir (pelos outros) quem é legal e quem não é.

Além de ser uma coisa extremamente jeca (pior que as dicas que ninguém pediu, só as mensagens blasê indefinidas do tipo “tem gente que pede um unfollow”), isso é a antítese da liberdade que a internet traz. Cada um que faça o que quer, sem esse tipo de patrulhamento ridículo que acaba sendo bem pior do que o comportamento supostamente impróprio das pessoas que são alvo das críticas.

Usei BBS em 1995 e navego na internet desde 1996; tenho blog desde 2001 e nunca segui nenhuma tendência, fosse de moda ou de antimoda (que dá na mesma); nunca utilizei imagens, por achar que minha prioridade é o texto, e jamais quis ser uma pseudocelebridade virtual ou blogueiro profissional. Quem gosta, que me acompanhe; quem não gosta, ou quem enjoa, simplesmente me deixa.

É assim que faço, sem alardes tolos.

Servimos mal para servir sempre.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Reflexões impopulares nada eclesiásticas

Faz algum tempo que pensei nesta hipótese, chegando até a discuti-la com algumas pessoas, mas só agora deu mesmo vontade de escrevê-la. Outro dia estava por aí e passei uma daquelas indefectíveis igrejas de garagem com cadeiras de praia, da qual estava saindo uma música gospel horrível (pleonasmo vicioso?), um pop rock furreca na qual o refrão “E Jesus ressuscitou” parecia ser repetido uma centena de vezes. Letra óbvia, instrumental chato, enfim, um atentado à boa música (e aos ouvidos do Nazareno, caso ele exista). Pensei no porquê de escolher uma forma tão desagradável e pouco criativa de louvar o objeto da crença deles, e concluí que (com o auxílio luxuoso das pessoas já citadas) que eles deixam estar a primeira porcaria que vem, sem lapidar, por acreditar que é inspiração divina, obra do Espírito Santo; logo, sendo o compositor mero instrumento de revelação, decide não interferir em nada e o brainstorming vai a seco pra canção. Ou talvez os crentes tenham o cérebro embotado mesmo a ponto de não saberem fazer boa música.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

I want you

Cada bomba que Israel joga significa o recrutamento de mais gente pro Hamas.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

So don’t let the bastards ground you down.

Imagine que cada dia seu tenha um valor a ser gasto, como naquelas promoções de celular em que você pode falar tantos minutos diários, e, se não usufruí-los, perde-se a cota daquele dia, reiniciando com o mesmo valor na manhã seguinte. Você compra um plano desses para dar valor à sua vida com as escolhas que faz: se decidir que seu dia vale pouco, digamos, R$ 1, a auto-estima se esvai por qualquer coisa, tudo é motivo para o dia ser estragado, afinal você nem vale muito mesmo... qualquer derrota será mera confirmação do fracasso que você é. Em vez disso, se você decidir que sua vida vale, diariamente, uns R$ 1.000, vai ser preciso muito para que seu dia seja considerado perdido, não é mesmo? Valorize-se. A cada dia você tem muito a gastar.